quarta-feira, abril 15, 2015

SOBRE PERMANÊNCIA NA UNIVERSIDADE

 Dyane Brito Reis

Há algum tempo, o debate sobre Ações Afirmativas vem tomando os círculos acadêmicos e, resguardada as devidas proporções, os círculos não acadêmicos.  Talvez, o grande problema é que a discussão tem trazido sempre o questionamento sobre “quem é sujeito de Direito no país”. Este debate expõe o sistema hierárquico social fundado no que Antônio Sérgio Guimarães (1995) denominou Dicotomia Preto-Branco. 
Ainda segundo Guimarães, essa dicotomia serviu, desde a nossa formação enquanto sociedade, para demarcar a distância entre Privilégios, Direitos, Deveres, mas também privações. 

O termo Ação Afirmativa, bem como a Política de Discriminação Positiva, não parecem ainda, estar elucidados tanto em termos de concepção, quanto em suas múltiplas formas de implementação. Embora  as Políticas Afirmativas envolvam uma série de medidas que visam neutralizar e compensar os efeitos negativos da discriminação, incluindo ai a Discriminação racial, a PERMANÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR, encontra entraves para ser pensada como parte desta discussão. 

 Há algum tempo, em parceria com Tenório (2009) chamávamos a atenção dos Gestores de Universidades Públicas, que o processo não acaba quando os estudantes de categorias sociais historicamente excluídas acessam uma vaga na Universidade. Ao contrário, existem questões relativas à permanência, ao ensino de qualidade e sobretudo às relações no ambiente acadêmico e às Representações Sociais (Reis e Tenório. 2009; 47). Podemos insistir em um discurso de igualdade, mas é certo, que as diferenças e as desigualdades históricas pesam de forma distinta para negros e brancos. É necessário que as análises e reflexões se produzam a partir de horizontes críticos e de posturas desmistificadoras do panorama histórico e do cenário atual.  

No ano de 2013, a partir dos dados da nossa pesquisa, buscamos traçar o perfil da Política Afirmativa na UFRB (Reis; 2013) e identificamos questões importantes para pensarmos a Permanência em nosso espaço Universitário. Há entraves, de ordem material, que fazem com que inúmeros estudantes dependam de uma “bolsa” para se manter na Universidade.  O mais grave é que em muitas situações, a “tal bolsa” não tem como função apenas, subsidiar a sua vida acadêmica, mas se constitui na única fonte de renda da família.  Como é possível falar em Permanência com qualidade nesse contexto? 

PERMANÊNCIA  é um conceito muito caro, já que diz respeito a possibilidade de existir. Permanecer não pode ser entendido aqui, como o simples ato de persistir apesar e sob todas as adversidades, mas a possibilidade de continuar estando dentro; estando junto (Reis; 2009).  

Ser reconhecido, ser visto pelo outro é a condição da existência simbólica: “eu só existo se o outro me reconhece”. E se o outro me reconhece como legítimo, aumentam as minhas chances de fazer parte, de estar junto. Tomo de empréstimo aqui a noção antropológica proposta por Maffessoli (1995), segundo a qual estar junto implica em uma busca por usufruir dos bens deste mundo, neste caso específico, do mundo acadêmico. Além disto, o estar junto antropológico busca aquilo que Foucault chamou de “cuidado de si”, ou seja, “buscar no quadro reduzido das tribos”; encontrar o outro e partilhar com ele algumas noções e sentimentos comuns ou ainda, como nos afirma Lahire (2004; P. 18) as condições de existência são antes de tudo, as condições de coexistência. Assim sendo, o nosso conceito de permanência possui uma relação direta com a existência dos indivíduos em primeiro lugar e sua coexistência em segundo.   

Ao entender a permanência sob esta perspectiva, observamos o quão grave é fazermos das Políticas de Permanência Estudantil uma moeda de troca. A política não é uma dádiva ou benesse entregue por um benfeitor ou uma benfeitoria. Trata-se de DIREITO. 
É grave se apontamos uma “mulher negra” e dizemos que ela levou mais tempo do que “o normal” para concluir a graduação. Afinal, qual é o tempo de uma graduação? Quais fatores interferem no tempo de conclusão de uma graduação? 

É grave quando não entendemos que existem diferenças entre homens e mulheres; homens negros e homens brancos, mulheres negras e mulheres brancas. Faz-se necessário compreender que desigualar é o primeiro passo para a conquista da igualdade. Todo Programa de Ação Afirmativa que se queira efetivo, precisa compreender que o acesso à Universidade é mais do que a aquisição de um Diploma. O acesso a Universidade deve representar acesso aos instrumentos de produção do conhecimento.

A Universidade precisa atender às necessidades de desenvolvimento científico e tecnológico de uma Sociedade, sem esquecer a qualidade de vida acadêmica e esta, deve ser compreendida enquanto subsistência, formação de qualidade e porque não dizer, empoderamento para que os estudantes e as estudantes possam exercer uma atuação efetiva em uma sociedade multicultural e pluriétnica.   

REFERÊNCIAS 
GUIMARÃES, A. S. A. . Racismo e Anti-Racismo No Brasil. NOVOS ESTUDOS CEBRAP, n. 43, p. 26-44, 1995.  
LAHIRE, B. Sucesso escolar nos meios populares – as razões do improvável. Editora Ática, 2ª Ed. 2004.  
MAFFESOLLI, M. A contemplação do Mundo. Porto Alegre, Artes e Ofícios Editora. 1995. 
REIS, D. B. TENÓRIO, R. M. Cotas e Estratégias de Permanência no Ensino Superior. In: Robinson Moreira Tenório; Marcos Vieira. (Org.). Avaliação e Sociedade: A negociação como caminho. 1ed.Salvador: EDUFBA, 2009, v. 1, p. 11-304.  
REIS, Dyane Brito. Para Além das cotas: a permanência de estudantes negros no ensino superior como política de ação afirmativa. Tese de Doutoramento apresentada ao Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal da Bahia. Dezembro de 2009. 
__________________CONTINUAR OU DESISTIR? Reflexões sobre as condições de permanência de estudantes negr@s na UFRB. In: SAMPAIO, SÔNIA M.R.; GONÇALVES, GEORGINA. (Org.). Observatório da Vida Estudantil: Estudos sobre a vida e cultura universitárias. 1ed.Salvador: Edufba, 2012, v. 1, p. 1-269. 

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